quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Não posso com homens que dobram o pijaminha



Crónica semanal do jornal Barcelos Popular - 9/09/2010

Primeiro a calça, muito bem dobradinha pelo joelho, depois o casaquinho de botões, pela cava das mangas, rigorosamente a meio.
Não posso com homens que dobram o pijaminha e depois o colocam aos pés da caminha muito bem feita e esticadinha.
Que lavam os dentes a todas as refeições do dia e ainda usam fio dental para alcançar os lugares mais difíceis.
Que ainda vivem na casa da mãe viúva, e que na ausência de garagem, tapam todos os dias o carrinho com uma cobertura comprada no Continente.
Que verificam todas semanas o nível do óleo e da água, quer seja nos vidros, quer seja no radiador. Que juntam aditivos à gasolina, anticongelante e outras porrinhas, para assegurar a durabilidade do motorzinho do Fiesta.
Não posso com homens que dobram o pijaminha.
Politicamente, posicionam-se à direita, ou à direita da direita, mas não vão aos comícios do partido porque não gostam de confusão nem de cheiro a suor. Têm no entanto a fotografia do líder na cómoda, juntinho à imagem de Nossa Senhora de Fátima com os pastorinhos.
Gostam de fado, mas não apreciam Zeca Afonso nem os cantores de esquerda de uma forma geral.
Amam o Carreira, o filho, e o Espírito Santo.
Forram o comando da televisão com o plástico original da embalagem para não estragarem as teclas, usam camilhas nos sofás para não os sujarem, e o mais importante de tudo, descalçam-se ao entrar em casa, entalando os pézinhos nos chinelinhos de quarto, colocados muito direitinhos num cantinho do hall de entrada.
Não posso com homens que dobram o pijaminha.
Não posso com o seu jeito amaricado, onanista, de unhas muito bem tratadas.
Não posso com as camisas de botões no colarinho, as calças vincadinhas, os sapatinhos de verniz, quais Cinderelas.
Guardam tudo o que é recibo de despesa em capinhas organizadas por temas, fazem o IRS em 20 minutinhos antes da mamã chamar para comer a sopinha de nabos e penca, e que depois entregam garbosamente na repartição de finanças do bairro, os primeiros da fila.
Vão à missinha ao Domingo de manhã bem cedinho, para depois almoçarem religiosamente com a mamã ao bater das 12 horas.
A moça que um dia quis casar com um homem assim, nunca existiu no fundo.
E eu, também no fundo, muito no fundinho, até nem desgosto de homens que dobram o pijaminha, eu não posso mesmo, é com o meu país.

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