domingo, 22 de novembro de 2009

Estava o gato alpendorado


Foto: António Jorge Fernandes

Estava o gato alpendorado, seguro no abismo, descansado nesse equilíbrio.
O homem, chegado por um fio de arame que se estendia até ao infinito, ao tentar afastá-lo para um último passo firme, escorregou e caiu.
A meio da queda lembrou-se de já ter sido pássaro num outro tempo, bateu asas e voou.
Quando podia finalmente usufruir da liberdade, regressou ao ponto de partida.
O gato sonolento deixou-se estar, alpendorado e perfeitamente equilibrado no abismo.
O homem pairou sobre ele batendo as asas como um querubim, e preparou vingativo um pontapé.
Quando o chutou, Deus fechou os olhos. Um bombista suicida fez explodir o mundo.
Ainda lhe restavam seis vidas, nas sete dos gatos, e na próxima já tinha decidido, queria voltar a ser baleia.
Deus adormeceu a pensar em coisas boas que ainda lhe podiam acontecer, e nunca mais acordou.
Veio uma nave e arrumou os cacos.

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